CADA POEMA É UM FRAGMENTO DO POEMA GERAL QUE QUINTANA VEIO COMPONDO
DURANTE TODA A SUA VIDA

segunda-feira

SONETO PÓSTUMO

Nada permanece igual no tempo, a não ser o próprio tempo. Quintana percebe isso como ninguém. Um velho amor valeu em seu próprio tempo.  Drummond diria: “Mudam-se os tempos/ mudam-se as vontades/ Muda-se o ser”  O tempo  é  implacável  e não tem piedade de nós, pobres e efêmeros humanos. Cecília Meirelles diria: “Talvez pensem que o tempo volta/ E que vens, se o tempo voltar”.  Neste poema Quintana afirma que o tempo não volta e nem o que éramos ou as sensações e sentimentos que sentíamos. “No fim, tu hás de ver que as coisas mais leves são as únicas que o vento não consegue levar: um estribilho antigo, um carinho no momento preciso, o folhear de um livro, o cheiro que tinha um dia o próprio vento...” Ou seja, o tempo como o vento passa...e deixa somente as recordações.

SONETO PÓSTUMO

- Boa Tarde... - Boa Tarde! - E a doce amiga
E eu de novo, lado a lado vamos!
Mas há um não sei quê, que nos intriga:
Parece que um ao outro procuramos...


E, por piedade ou gratidão, tentamos
Representar de novo a história antiga.
Mas vem-me a idéia... nem sei como a diga...
Que fomos outros que nos encontramos!


Não há remédio: é separar-nos pois.
E as nossas mãos amigas se estenderam:
-Até breve!  - Até breve! - E, com espanto


Ficamos a pensar nos outros dois.
Aqueles dois que a tanto já morreram...
E que, um dia se quiseram tanto!

Junho, 1952
Mario Quintana in: Baú de Espantos

4 comentários:

piedadevieira disse...

O tempo não volta, concordo com o mestre, mas o essencial é eterno: ler Quintana.
Beijos e aguardando sua visita.

Luiza disse...

Alimento da alma. Quintana como tantos outros desperta em nós o desejo de soltarmos nossas asas... imaginar... criar... voar...

Indisível.

Tais Luso de Carvalho disse...

Que lindo de ver a simplicidade, o despojamento, a indiferença com o que não é essencial; de ver, ainda, o poeta-moleque! Este é o Quintana. Sabes bem, Bernardo, que este é o meu poeta e aqui encontro, sem pestanejar, coisas realmente do Quintana.

bjs, amigo!
tais luso

Layta Ribeiro :* disse...

ameeei o poema (: