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segunda-feira

HISTÓRIA MÁGICA


Era um perfume tão pesado que os corpos se amolentavam, rendidos, e uma névoa de banho de vapor esfumava o contorno das flores de pétalas abertas, dos frutos enormes, que pareciam prestes a cair. Não se sabiam se eram cobras dormentes, ou lianas semi-vivas, aquelas coisas pendidas das galharias... Pássaros não se viam, nem sáurios furtivos, nem grandes ou pequenos quadrúpedes. Mas gritos misteriosos, que a gente não podia identificar, feriam de quando em quando os ouvidos, acordando-os do torpor em que os adormecia o zumbir ininterruptp dos insetos. Os pés chapinhavam, como em barro, no musgo verdoengo que tapetava o chão.
Caminháva-mos, arquejávamos, sem dizer palavra. O nosso guia e rei seguia à frente, invisível, sua presença acusando-se (nas horas de maior angustia, parecia) por um agitar frenético de guizos. Um dia, não mais o escutamos e cada qual, com um ingrato alívio, seguiu seu próprio caminho. Cada qual se extraviou, sentou-se, enfim, para morrer.
E cada um morria pensando invejosamente que os outros houvessem encontrado alguma coisa, uma fonte de virtudes nunca imaginadas, uma princesa, um mágico, algum Deus ainda bárbaro ou no seu mais adiantado estágio, mas sempre um Deus, mas sempre alguma coisa. Pensava em tudo isto, sim... e sentia, no entanto, um monstruoso orgulho de morrer sozinho...

Mario Quintana
Antologia Poética
Pág 120

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